Receber o diagnóstico de câncer já é uma surpresa dolorosa para muitos. Ainda há muitas informações a serem socializadas para que esse momento seja mais humanizado e o próprio diagnóstico seja desmistificado. É imensurável o impacto emocional de uma consulta de rotina, quando ela se transforma em uma conversa difícil com o médico sobre “recalcular rota” para os próximos meses. Numa situação como essa, a pessoa normalmente volta para casa, sabendo que está diante do desconhecido e que precisará fazer mudanças em sua vida, mesmo que temporariamente.
Sabe que vai precisar reorganizar seu projeto de futuro, adiar alguns planos, antecipar outros, pensar em coisas que muitas vezes nunca pensou, como por exemplo, buscar uma equipe profissional para discutir e acompanhar detalhadamente tudo sobre sua saúde, sua alimentação, sua qualidade de vida, seus hábitos. É impossível evitar a ansiedade, principalmente no início, diante de qualquer tipo de tratamento longo e específico, que no seu percurso exige muitas mudanças de rotina, como afastamento do trabalho, uma agenda carregada de exames e consultas, mudança de hábitos alimentares, de convivência social e outras adaptações pontuais.
No caso do tratamento oncológico, essa angústia começa a ser superada passo a passo com a ajuda de uma equipe presente e amorosa, que possa oferecer ao paciente, todas as informações, o apoio e o suporte necessários para que retome sua auto confiança e perceba que é capaz de protagonizar todas as etapas de seu tratamento. Esta é uma dinâmica, que na maior parte das vezes, evolui para um elo de muito crescimento para ambas as partes, tanto paciente e sua família, como para profissionais da equipe, que desenvolvem habilidades importantes para superação dos desafios que possam surgir, se unem na afetividade, generosidade, resiliência e passam a ser uma só família.
Entretanto, no meio desta história de busca de superação e vitórias, surge a pandemia, que da mesma forma impactou nossas vidas exacerbando esses sentimentos, nos colocando em uma constante sensação de ameaça e com todas as frentes do mundo inteiro sem saber lidar com o momento.
E no consultório ouvi: “Eu adoeci e o mundo adoeceu também.”
E assim como todo doente, o mundo foi para a emergência e os demais precisaram esperar. Pelo menos no início (e para o desespero de muitos), consultas, diagnósticos, encaminhamentos e cirurgias foram colocados em lista de espera. Com o passar dos meses, ainda durante a pandemia, com um pouco mais de informações, os serviços foram sendo restabelecidos. Os protocolos foram criados, as vacinas foram chegando e a medicina foi vencendo os desafios para continuar sua missão.
A cada dia, recebemos o pedido de todos os órgãos de informação, para tomarmos fôlego, para suportarmos um bocadinho mais de tempo essa instabilidade, que nos tirou da nossa zona de conforto. É realmente uma arte vivenciar ao mesmo tempo dois desafios: um tratamento e uma pandemia. Neste cenário, como era de se esperar, as redes sociais se tornam uma inundação de propostas de solução para nossas angústias. As antigas receitas caseiras para emagrecimento dão lugar para os posts sobre bulas, dicas sobre imunidade, palestras sobre como prevenir doenças, sites facilitando compras de tudo o que podemos imaginar.
KÁTIA CRISTINA EMMANOEL
Psicóloga
CRP/SP 06/57.685